Ct 8.8-9
Pensando a nova geração
Apecom 2024
“Temos uma irmãzinha que ainda não tem seios; que faremos a esta nossa irmã,
no dia em que for pedida? Se ela for um muro, edificaremos sobre ele uma torre de prata; se for uma porta, cercá-la-emos com tábuas de cedro.”
(Cânticos 8.8,9)
Eu já expus o Livro de cantares em vários lugares, em diferentes ocasiões para públicos distintos. Estudar este livro é fascinante especialmente quando você descobre sua pista hermenêutica, foi melhor sugerida por Heinrich Ewald, em 1824, portanto, 200 anos atrás. Ele levanta a hipótese do drama com três personagens nos ajuda a compreensão e nos faz ver o livro com outros olhos. Sua abordagem é pertinente e plausível. Se você quiser saber um pouco mais existem outros artigos que já escrevi sobre esta linha hermenêutica e você pode também encontrá-la no meu livro “Teologia do Afeto”. Todo segundo capítulo é dedicado a esta discussão.
Este texto de Ct 8.8,9, entretanto, não parece se encaixar muito bem na fluidez da narrativa bíblica. Eles pareciam fora do contexto e até mesmo surgindo de forma abrupta. O que significam estas palavras? “Temos uma irmãzinha que ainda não tem seios; que faremos a esta nossa irmã?”
Numa palestra para um grupo menor, citei estes dois versículos dizendo que eles me pareciam não se encaixar claramente na estrutura do texto. Eu expressei minha dúvida indagando qual seria seu significado no contexto Cantares. Qual seria o significado destes versículos? Eles me pareciam soltos e desconexos
Uma mulher presente, com extrema lucidez, sugeriu algo muito especial, e passou a fazer todo sentido: Não estaria o autor dando um alerta e uma orientação sobre como devemos cuidar da próxima geração? Considerando a relevância da mensagem de Cantares, não seria uma recomendação para olharmos nossas crianças que ainda sequer chegaram à puberdade e que estão sendo impactadas por uma estrutura e sistema social tão pesado? O texto está falando da geração que ainda está desabrochando: são meninas que nem sequer possuem seios. São tenras, novas, e precisam de cuidado, como uma frágil flor que precisa de adubo apropriado, precisa ser regada e cuidada.
Temos neste texto um alerta, uma pergunta e duas diretrizes:
1. Alerta: "Temos uma irmãzinha que ainda não tem seios." A nova geração está ai, entre nós. sao as crianças crescendo entre nós. Uma irmãzinha ainda antes da puberdade, antes da mestruação, mas que já sofre os impactos do ambiente e da cultura que a cerca.
2. Pergunta: "Que faremos a esta nossa irmã, no dia em que for pedida? " Antes de seu casamento, antes de seu namoro, o que devemos fazer? Qual deve ser a direção dos pais e avós, daqueles que tem a responsabilidade de conduzir, guiar e orientar? Elas precisam de direção, onde está o manual de orientação, o plano mestre para conduzir estas crianças com segurança, antes que se casem. Quando casarem já deverão estar preparadas. Alguém perguntou a um sábio quando deveria começar a educação de uma criança, e ele respondeu: "vinte anos antes dela nascer."
3. Duas diretrizes: "Se ela for um muro, edificaremos sobre ele uma torre de prata; se for uma porta, cercá-la-emos com tábuas de cedro.” Como podemos ver, as recomendações são diferentes, a personalidades diferentes. Uma é muro, outra é porta. Por serem diferentes, a cada uma destas meninas, as respostas devem ser diferentes. Pessoas distintas exigem orientação distinta. Educação de filhos é um grande desafio, porque as regras não podem ser iguais.
Então, precisamos aprofundar nossa compreensão deste livro para extrair as lições que brotam do texto. Quem deve causar impacto não é o pregador, mas a palavra. Como dizia Lutero: “a Bíblia é como um leão, não precisamos defendê-la, apenas soltá-la.”
Precisamos encontrar uma linha de interpretação. O problema é que ninguém se aproxima do texto bíblico sem pressuposições. São muitos os métodos adotados na abordagem da Bíblia, mas queremos seguir o Método Histórico Gramatical que é adotado pela Reforma Protestante.
Recusamos o método histórico crítico, ou A Crítica das Formas, também conhecida como "Formgeschichte", um método de interpretação bíblica que se concentra na análise das formas literárias presentes nos textos bíblicos, e que, apesar de trazer uma boa compreensão textual, tem três problemas:
Excesso de Foco na Forma: Há o risco de focar excessivamente na forma literária e negligenciar o conteúdo e a mensagem do texto.
A crítica das formas tem dois problemas:
Subjetividade: A análise das formas literárias pode ser subjetiva, levando a diferentes interpretações por parte dos estudiosos.
Desvalorização da Inspiração Divina: Por causa de sua base liberal, se recusa a ver a bíblia como totalmente inspirada e inerrante e esvazia a importância da inspiração divina da Bíblia.
Rejeitamos o O Método Alegórico de Interpretação Bíblica, que sempre busca ir além do significado literal dos textos, buscando interpretações simbólicas e figuradas. Esse método, com raízes na filosofia grega antiga, ganhou força na Alexandria do século III d.C., com Clemente e Orígenes como seus principais proponentes, pois, ao invés de interpretar o texto naturalmente quer encontrar significados mais profundos em elementos como Personagens, eventos, números e objetos, abusando da subjetividade, onde a interpretação depende da imaginação do intérprete, distancia o texto do seu significado original e sempre desvalorizar o sentido histórico da Bíblia.
Os pregadores neopentecostais usam e abusam deste método, pregando mensagens subjetivas e imaginativas, mas sem conexão real com o texto lido. O maior e mais conhecido defensor da alegoria da
Bíblia foi Filo de Alexandria:
Rejeitamos ainda as linhas de interpretação bíblica como a mítica que tenta fazer com que as narrativas transmitam ensinamentos e valores por meio de símbolos e metáforas, em vez de fatos históricos, e a psicológica, que reduz a Bíblia a um mero texto psicológico, negligenciando sua dimensão espiritual e teológica. A interpretação mitica vê neste texto um diálogo entre a Alma e Deus.
O Método histórico gramatical, adotado pela reforma, é um dos mais tradicionais e rigorosos, e busca compreender o significado original dos textos bíblicos, levando em consideração o contexto histórico e cultural em que foram escritos, bem como as nuances da língua original.
Seus Princípios Fundamentais são:
· Análise Histórica: analisa o contexto em que os textos bíblicos foram escritos, buscando entender os eventos, costumes e crenças da época.
· Análise Linguística: análise minuciosa da língua original dos textos bíblicos, focando na gramática, vocabulário e estilo literário.
· Interpretação Original: qual o significado original que os autores pretendiam transmitir em seus escritos.
Quatro passos são usados por este método:
· Observação: Leitura atenta do texto, identificando palavras-chave, estrutura e estilo literário.
· Análise: Investigação do contexto histórico e cultural do texto, incluindo costumes, eventos e crenças da época.
· Interpretação: Determinação do significado original do texto, levando em consideração os resultados da análise histórica e linguística.
· Aplicação: Aplicação dos ensinamentos do texto à vida do leitor, de forma consistente com o significado original.
No Método histórico gramatical busca-se o sentido natural do texto. O que Deus queria dizer aos escritores. A bíblia foi escrita por cerca de 40 escritores, mas apenas um autor. O Rev. Wilson Souza de Belo Horizonte afirma: “Se Deus não disse o que teria dito, porque não disse o que teria de dizer?”
Então, precisamos nos aproximar de Cantares, da forma mais natural possível.
Duas observações diretas no texto:
No Cap 4, existe a descrição de um corpo feminino descrito de baixo pra cima
Cap 7 - Corpo feminino descrito de cima para baixo
Interpretações ortodoxas mais aceitas:
ü Judaísmo: Israel e Iahweh
ü Catolicismo: Maria & Jesus
ü Protestantismo: igreja e Cristo
ü Versao King James Version: Christ Speaks/ Church speaks.
Em 1826, Heinrich Ewald suscitou uma questão gramatical e exegética. Salomão não seria o autor de Cantares, mas um dos personagens aparecendo cinco vezes nas narrativas: (Ct 3.7,9,11 e 8.11,12)
De inicio, surge, entretanto, uma questão gramatical: Como explicar a preposição לִ “Lama” (hebraico), que surge no capítulo 1.1? “Cântico dos cânticos de Salomão? שִׁיר SHYRהַשִּׁירִיםHASHYRYMאֲשֶׁרASHERלִשְׁלֹמֹה: LISHËLOMOH:
Uma tradução diz: “Que é de Salomão.”
Várias possibilidades:
a. De – no sentido de autoria.
b. De – no sentido de que pertence a Salomão. O dono do pergaminho é de Salomão, fazia parte de sua biblioteca ou do palácio.
c. De – No sentido que “o assunto” é Salomão.
Heinrich Ewald assume que se trata de uma crítica a Salomão.
Cantares seria um cântico sapiencial com quatro personagens centrais:
O rei Salomão
A Sulamita
O pastor – que era o companheiro da Sulamita
As filhas de Jerusalém: que cuidam do harém.
Este drama seria dividido em cinco atos:
Primeiro Ato: 1.1–2.7
Segundo Ato: 2.8-3.5
Terceiro Ato: 3.6 – 5.8
Quarto Ato: 5.9-8.4
Epilogo: 8.5-8.14
A Sulamita era uma das filhas de Israel, de cor negra (Ct 2.5-6), que um dia atraiu os olhos de Salomão, um rei lascivo. A estrutura social permitia este tipo de transação. Salomão paga mil siclos por esta adolescente, filha de uma família de camponês, e a leva para fazer parte do seu harém e ser possuída quando e se o rei desejasse. Ela foi vendida, o dote foi pago, e até chegar ao palácio algumas pessoas ficaram responsáveis por proteger o “patrimônio” do rei, recebendo o pagamento de 200 siclos.
A menina segue para o palácio, para viver numa estrutura totalmente diferente da que ela conhecia. Ela era uma menina de zona rural que agora se encontra num ambiente de púrpura, de vaidade e luxúria. Isto poderia ser o sonho de consumo de muitas pessoas, mas não foi o seu caso. Ela estava enamorada de um camponês, e seu amor estava voltado para ele e não para atender os caprichos de Salomão. Ela visivelmente encontra-se indisposta, e isto se revela no refrão que se repete quatro vezes no texto de Cantares, quando ela repete insistentemente e de forma até mesmo agressiva, às filhas de Jerusalém, as mulheres do harém, que precisam prepará-la para ser possuída pelo rei.
“Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, que não desperteis
nem acordeis o amor, até que este o queira.” (2.7; 3.5;5.8; 8.4)
Este refrão é essencial na compreensão textual. Sua insistência revela a essência do texto. Percebe-se oposição, tensão, confrontação. Não se trata de uma linguagem fraterna, mas de uma palavra de revolta e resistência. Há alguma coisa que o narrador do texto deseja revelar. A Sulamita se opõe à lógica do palácio e resiste à dinâmica do harém. Há um desconforto implícito no texto. Ela desafia e resiste à sugestões das “filhas de Jerusalém”, que provavelmente eram as mulheres lideres do harém. Pressionada, sem querer se envolver, a menina trazida pelo dote do rei ao palácio, encontra-se na contramão do discurso e do diálogo das mulheres responsáveis em cuidar do harém. Ela as “conjura”. Conjurar é um termo forte...
Por isto o nucleo da mensagem de Cantares, certamente se encontra no capitulo: "As muitas águas não poderiam apagar o amor, nem os rios afogá-lo. ainda que alguém desse todos os bens pela sua casa, seria de todo desprezado." (Ct 8.6-7) Há dissociação intencional entre dinheiro e amor, entre pagamento e fidelidade.
O livro de Cantares é um livro de resistência, de luta, de oposição. Aparentemente a Sulamita resiste bravamente porque no final ela declara orgulhosamente: “A vinha que me pertence está ao meu dispor; tu, ó Salomão, terás os mil siclos, e os que guardam o fruto dela, duzentos.” (Ct 8.12). O dote exuberante do rei, é devolvido. Isto traz prejuízo à família que de forma voluntária, ou não, havia se submetido a este sistema perverso.
No final do livro ela diz precisamos tomar cuidado com a nova geração que enfrentará problemas como eu também enfrentei. Existe uma nota de dignidade e orgulho pessoal ao afirmar: “Eu sou um muro, e os meus seios como as suas torres; sendo eu assim, fui tida por digna de confiança do meu amado.” (Ct 8.10).
A expressão “A vinha que me pertence está ao meu dispor”, é uma nota de vitória, de conquista pessoal, que se opõe ao seu lamento e dor expressos no início do livro, quando declarou: “a vinha, porém, que me pertence, não a guardei.” (Ct 1.6d) No texto inicial está explicita sua dor, culpa e impotência, em não poder ser dono sequer de si mesma, e não proteger aquilo que lhe pertence, que é o seu corpo. Privada de sua dignidade, ela lamenta sua incapacidade de proteger-se.
O texto revela vários conflitos:
1. Estilo de vida de luxo do palácio (1.4) X Simplicidade da zona rural. (1.16)
2. A sofisticação das recâmaras, quarto de intimidade (3.9-10) X Ambiente rústico (4.9; 7.12)
3. Entre a cor da pele da Sulamita (3.5,6) e as mulheres do harém
4. Entre a Sulamita e as filhas de Jerusalém. “Conjuro-vos” é o refrão que divide cada um dos atos dos dramas. Uma expressão forte.
5. Conflito entre abertura e fechamento. Ele possui uma relação dialética entre se entregar e se afastar.
a. Muro (8.10) x abertura (4.14-16)
Ela vê o sexo como algo bom, e ela é aberta à intimidade, mas muitas vezes se coloca em franca oposição ao outro. “Vinho que se escoa suavemente para o meu amado.”
b. Doce ao paladar (7.9-10)
c. Posição sexual (2.6)
6. Conflito entre o rei e suas propostas boçais (1.9-11), e a linguagem sensual, intimista e sensível do amado (2.10b)
7. Conflito entre o assédio barato e a proposta esdrúxula do rei (6.8-9) e a linguagem pessoal: “minha irmã”, “noiva minha” (4.7-12). Uma linguagem é de intimidade, outra é de resistência.
8. Conflito entre o fracasso inicial da Sulamita “a vinha que pertence eu não a guardei” (1.6) x seu orgulho pessoal e dignidade no final “A vinha que me pertence está a meu dispor.” (8.12)
9. Conflito entre a presença do rei (1.12) x o amado ausente: “Onde apascenta os rebanhos” (1.7) “galgando sobre os montes.” (2.8) “Ele tem saudades” (7.16). “Pra onde foi o teu amado?” (1.7; 6.1) “que é o teu amado?” As filhas de Jerusalém não o conhecem (5.9); ela quer sair do palácio (4.6)
10. A doçura da voz do amado (2.10; 5.16) x as interpolações mal-sucedidas: “As éguas de Faraó eu te comparo.” (1.9)
11. As filhas de Jerusalém tentam convencê-la do privilégio de fazer parte do harém real. Falam da suntuosidade da liteira do rei. (3.7) e do quarto do rei (3.10). X A conjuração: “Não acordeis nem desperteis o amor até que este o queira.”- Não force a barra! Ela indaga reativa: “Por que quereis contemplar a sulamita na dança de Maanaim?” (6.13)
Curiosamente a expressão “eu sou um muro” (Ct 8.10), vem logo depois da discussão em torno da irmãzinha que “ainda não tem seios” (Ct 8.8) e que precisa de proteção e de portas, estruturas de defesa. Ela declara sua dignidade e autonomia, revelando sua vitória contra tudo e todos. Superação, logo depois da indagação sobre o que fazer com as crianças, ainda sem seios, puras e tenras, que precisam ser cuidadas.
Que fazer com a próxima geração?
O grande desafio proposto é “O que fazer com a próxima geração?” Este é o grande desafio que temos diante de nós. Era um desafio no sistema pecaminoso de Israel, nos dias de Salomão, e se constitui no grande desafio que temos ainda hoje, com gerações que estão sendo levadas por estruturas tão iniquas e pervertidas.
A irmãzinha que ainda não tem seios, é a criança, crescendo num ambiente onde se mercantiliza as crianças, que são vendidas como mercadorias. De um sistema que sexualiza as crianças com orientações que são ensinadas antes mesma de serem capazes de discernir o certo do errado, e antes de terem noções sobre o significado do que é sexo.
O grande problema: A cultura desvirtuada moralmente não fere apenas os adultos, que são bombardeados por uma cultura pluralista, subjetivista, relativista e que leva os pais a nem sempre estarem certos de que a orientação que estão trazendo é justa, correta, saudável. Os pais estão confusos, na maioria das vezes, por princípios contrários aos valores bíblicos, mas não sabem orientar, proteger e disciplinar os filhos, e tem que lidar entre a culpa, de serem rígidos, ou da flexibilidade e frouxidão, por não serem capazes de exercer disciplina. A confusão de valores atinge diretamente filhos e filhas.
A cosmovisão cristã é multifacetada pelo secularismo, paganismo e valores morais muito baixos, uma sociedade que pressiona: tolerância, aceitação, concordância. Não podemos mais ser protestantes, precisamos ser “concordantes.” Os amigos, vizinhos, colegas de trabalho estão sempre questionando nosso estilo de viver. Na verdade, Pedro percebia esta mesma tensão na cultura do primeiro século: “Por isto, difamando-vos, estranham que não concorrais com eles ao mesmo excesso de devassidão.” (1 Pe 4.4) Como responder as tentações, provocações e induções que a sociedade moderna traz?
Várias vezes tenho sido inquirido como pastor, por membros de nossa igreja sobre “casamento homossexual.” Um cristão poderia participar de uma cerimônia destas? Muitos são amigos e gostariam de apoiar. Então, tenho que cuidadosamente dizer que participar significa “concordar”. Que a aproximação correta deveria dizer: “Eu amo muito você, mas você conhece minha posição como cristão acerca deste assunto. Isto não me transforma em alguém homofóbico, mas vai contra a minha consciência. Seu casamento não muda o meu carinho por você, mas não quero estar em uma cerimônia apoiando algo com o qual eu não concordo.” Nem sempre as pessoas são capazes de ter uma posição clara, amorosa e firme com assuntos como este.
Isto se reflete na educação e disciplina de nossos filhos. O que fazer com “a irmãzinha que ainda não tem seios?” Com crianças ainda tão tenras que precisam de orientação e direção? Como protegê-las de um sistema tão perverso e tão antibíblico? O maior desafio não é para nós, adultos, mas para as crianças tenras que caminham entre nós.
Veja o que aconteceu em Israel. Em Jz 2.10-11, logo após a morte de Moisés e Josué, o povo parece ter perdido a noção da lei e do significado de ser povo de Deus. De uma geração para outra teve uma quebra violenta. A próxima geração não conhecia o senhor e nem sabia dos milagres que Deus havia feito entre eles. Eles perderam a relação com Yahweh e não receberem sequer, a comunicação feita através da tradição oral, dos feitos do Senhor, e começaram a viver atrás de astarotes e baalins, ídolos da terra.
O Salmo 78 é um texto desafiador. Nos fala dos cuidados que precisamos ter com os flhos, filhos dos filhos, e “aos filhos que ainda hão de nascer” (Sl 78.6). O que fazemos hoje impactará nossos netos, trinetos, tetranetos, que ainda não conhecemos e nem viremos a conhecer. Um legado passa de geração para geração, e o que fazemos hoje tem efeito não apenas sobre a nossa geração, ou a próxima geração, mas nosso olhar, atenção e cuidado deve atingir aqueles que ainda hão de nascer
Olhando com antecipação o cuidado que precisamos ter com a nova geração?
No livro “Point Men”, Steve Farrar afirma que: “A única matéria prima que Deus tem para fazer um homem é um garoto, a única matéria para mulher são as meninas.” Portanto, a matéria prima que temos em mãos é algo muito precioso para nossas vidas. Precisamos de cuidar das novas gerações. Este foi e será o grande desafio para a igreja.
Sua fé está chegando a filhos e netos?
Que tipo de fé estamos legando?
“Temos uma irmãzinha que ainda não tem seios; que faremos a esta nossa irmã,
no dia em que for pedida?”
Creio que, feito estas considerações, podemos tentar responder a esta pergunta provocativa, instigante e forte que é feita neste texto bíblico.
1. Precisamos estar muito atentos ao sistema. Temos em Cantares três sistemas complexos e interligados: A dinâmica da família, a estrutura social e a estrutura de poder.
O sistema torna a depravação algo sistêmico como vemos em Gn 19.4 que afirma que jovens e velhos se uniram para fazer uma orgia com os hóspedes de Ló. Pecados sistêmicos são parte de uma cultura e passam de uma geração para outra. São pecados sociais, não apenas individual. Pecados coletivos que atingem e permeiam uma cultura específica.
Este texto nos mostra a pressão atinge famílias, sociedade, e estruturas de poder. Num primeiro plano, observamos aqui a família sendo impactada.
a. A dinâmica da Família – a família está debaixo da opressão da cultura e do sistema. Ct 8.10 – Salomão pagou “o dote” à família. E a levou para ser parte do harém. Qual o papel desta família? Como ela pode lidar com as fontes de poder?
Numa belíssima análise feita por Emilio Garófalo sobre Ester (Ester na casa da Pérsia), ele afirma que podemos ver Ester como vítima, vilã e pecadora. E que isto tem relação direta com todos nós. Ao falar de Ester como vítima, ele analisa a realidade do poder, quando um rei, quase onipotente, resolve pegar jovens recém-saídas da adolescência, para um “test drive”, e descobrir qual delas poderia substituir à rebelde rainha que se recusou a comparecer a seu chamado na frente de seus súditos maiores, num ato de rebeldia sem precedentes. Os soldados agora saem em busca de meninas bonitas, de pele macia, de beleza estonteante, rostos bem formados, corpo durinho, para pertencer ao rei, que a usaria e, se não aprovada, seria descartada. Ela é levada para o harém de Artaxerxes, para ser selecionada entre muitas, é uma menina linda, cheia de vida, adolescente. Seus tios não podem dizer não, e neste sentido ela é vítima. Neste sentido, Ester é vítima.
Ao perceber a dinâmica do poder no palácio, Ester aprende que tem tudo o que o sistema deseja, ela é bonita, fina, educada, esperta, articulada, e torna-se simpática e amiga daquele que dava as coordenadas para as moças que estavam à disposição do rei. Ela é orientada pelo eunuco chefe, e aprende a lidar com o sistema, muda seu nome, nega sua origem e fé, ela era Hadasha (nome hebraico), e agora adota nome persa (Ester). Ela nega a sua identidade de povo de Deus para sobreviver num sistema pesado. Ela aprende as regras do comportamento social e se adequa. Neste sentido ela é pecadora. É muito difícil rejeitar o mundo quando você tem aquilo que o mundo quer de você: seja beleza, sexo, poder, inteligência, charme, educação. Neste sentido, Ester é vilã. Ela aprende a lidar com as forças do poder.
Por último, Garófalo fala de Ester como alguém em quem a graça de Deus opera, pois neste turbilhão de dores e malandragens, Deus ainda assim a usa, dentro dos seus planos para livrar o povo de Israel de um grande massacre. Deus tem o poder de operar no meio do caos e das demandas de um mundo em queda, mesmo quando estamos rodeados de regimes e monarquias poderosas, sistemas opressivos e inescrupulosos, que demandam uma postura de resignação e aceitação.
No Livro de Cantares. a família da Sulamita, da mesma forma não tinha como rejeitar a forma dominadora de Salomão. Num sistema monárquico, alguém poderia questionar ou fazer alguma coisa contra a vontade do rei? Ignorando os sentimentos da Sulamita, a família, talvez, até mesmo considerasse um privilégio que sua filha fosse para o palácio e eles recebessem um dote tão magnífico. A família não tinha força para confrontar o palácio. A filha de uma família pobre, que amava outro homem, é levada para o harém, para estar à disposição do rei para fazer um teste drive. Daí sua tristeza e desabafo logo no início de Cantares: “A vinha que me pertence, esta eu não guardei.” (Ct 1.6). Só quando ela supera todo este processo de exploração e abuso, conseguirá afirmar no final: “A vinha que me pertence está a meu dispor.” (Ct 8.12) Ela declara orgulhosamente que a vinha não estará a dispor do poder, do dinheiro e do sistema. Nem nas mãos dos homens que acham que é possível comprar e vender o amor.
Quando eu pergunto qual o texto que a maioria das pessoas se lembra de Cantares, elas citam Ct 8.7: “As muitas águas não poderiam apagar o amor, nem os rios afogá-lo. Ainda que alguém desse todos os bens da sua casa pelo amor, seria de todo desprezado.”
No texto de Cantares, temos que olhar a família, oprimida e violentada, mas ao mesmo tempo pecadora, adequada ao sistema. Que ao receber uma boa quantia em dinheiro pelo dote, libera sua filha, exerce seu papel perverso nesta corrente de opressão e reproduz o sistema. A família encontra-se debaixo de uma estrutura de opressão. Pecadora, vitimizada e oprimida.
Será diferente em nossos dias?
Como nossas famílias estão sendo sufocadas pela cultura do narcisismo, pela idolatrização do corpo, pela ditadura da beleza, pelos padrões sociais? Famílias pobres sofrem pelo poder dos poderosos que compram, vendem, abusam do poder pecuniário. Famílias ricas, por sua vez, são engolidas num desejo de atender as expectativas sociais e de elites depravadas, filhos e filhas são esmagadas pela sexualidade precoce, expostas a sociedades desorientadas espiritualmente.
Como poderemos nos livrar de um sistema tão feroz e demoníaco?
b. A estrutura social: filhas de Jerusalém.
As filhas de Jerusalém demonstram que há todo uma estrutura social, sustentada pela elite e propaganda, para convencer-nos de que está tudo certo do jeito que está, que se entregar ao poderoso Salomão, por causa de seu luxo e opulência, é um privilégio. Vemos aqui as vozes da sociedade personificadas nas mulheres que foram também arrastadas para o harém, impotentes, e que, na medida em que o tempo passa, adotam a postura da exploração e defendem este círculo doentio para sustentar a luxúria real. Tendo 300 mulheres e 700 concubinas no seu harém, Salomão poderia se dar ao luxo de possuir uma mulher diferente, todos os dias, por três anos seguidos, sem retornar à primeira com a qual dormiu.
A Sulamita se torna a voz transgressora que questiona. Há uma clara oposição no harém. As filhas de Jerusalém não entendem, enquanto a Sulamita tenta sobreviver com seu discurso tão adverso ao sistema:
“Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, que não acordeis nem desperteis o amor, até que este o queira.”
Conjuração é uma palavra forte, de oposição e confronto. A Sulamita está pressionada, sendo massacrada, mas todo discurso do poder não faz sentido no seu coração e ela está reagindo, veementemente, tentando se proteger.
Como será que nossas filhas e filhos estão se protegendo do discurso do sexo livre? Da ideologia do gênero, do uso de maconha, da moral relativa, da subjetividade e fluidez dos afetos, da pluralidade de sentidos em contraste com a exclusividade do evangelho? Uma adolescente de 14 anos, filha da igreja, reclamou com sua mãe que estava se sentindo acuada porque todas suas colegas já tinham tido sexo com sua idade, e apesar dela ter suas convicções tão claras, ela sofria constrangimento das suas colegas. Nossos filhos, bebem álcool cada vez mais cedo e estão pressionados a fumar maconha. Só nós não vemos. “O tempo passou na janela, só Carolina não viu.”
As mulheres do harém acham que ser possuída pelo rei é algo fantástico, elas indagam: “Que é o teu amado mais do que outro amado?” (Ct 5.9) As meninas do harém não conseguem entender este amor da sulamita por um pobretão se ela tem no palácio a oportunidade de ter sexo com o rei, tão admirado por todos, cuja recâmara é tão suntuoso, com design moderno, luxuoso. (Ct 3.9-10)
c. A Estrutura de poder do palácio que oprime, acha que pode comprar tudo com dinheiro. Tudo é permitido para quem tem poder!
Por último, temos a estrutura dos poderosos. O livro de cantares é um livro de questionamento de sistemas: Família, sociedade, e os poderosos. Criando uma tríade maligna, um ciclo sistêmico e perverso.
São forças agindo poderosamente. Pecado não é algo apenas individual. Pecados sistêmicos e estruturais. Cultura caída. Pecaminosa. Dominada por valores morais distantes e estranhos à ética cristã e aos padrões do Deus de Israel.
As filhas são pressionadas a terem sexo. Virgindade é um problema. Os garotos são pressionados para usar drogas, recebendo nudes de garotas aos 12 e 13 anos no celular. Envolvidos com bebida alcoólica e indo pra cama muito cedo e com um número cada vez mais de parceiros. Quem não se encaixa está fora da estrutura. É questionado na masculinidade e feminilidade. Pré adolescentes são obrigados a “assumir sua identidade sexual” como se a identidade sexual não existisse e cada um pudesse escolher o sexo que terá. Contudo, é bom lembrar que, ao nascer, nenhum pai ou mãe olha para uma criança e fica em dúvida se é homem ou mulher, nem planeja ir ao um sex shop e cobrar um pênis ou vagina, de acordo com o cliente. Ao nascerem, os pais já colocam no quarto a plaquinha: “it’s a boy. It’s a girl.” Qual é a dúvida mesmo?
Crianças que ainda nem sabem o que é sexo, agora estão sendo obrigadas a “fazer escolhas” sobre sua “identidade sexual”. Todas estas coisas são formas de controle e pressão que os sistemas possuem.
Precisamos proteger as novas gerações. O que faremos com nossa irmãzinha que ainda não tem seios? Conceitos pagãos avassaladores assolam as igrejas, pressionam as famílias. Os pais da Sulamita cederam a filha, e talvez, até tivessem gostado de ter feito um negócio tão bom: Vender a filha por mil siclos para ser possuída pelo homem mais importante da nação judaica. O rei de Israel.
A filha diz que amava outro homem, ela não quer ir para o palácio. Ela não está interessada pelo rei, ela ama alguém da sua aldeia, mas a família, impotente, permite, aprova ou até mesmo a empurra para ir o palácio. O sistema é muito mais forte que imaginamos.
Os Guiness, discípulo de Francis Schaeffer, descreve o sistema como uma jiboia, que atrai sua presa, hipnotiza, e quando esta percebe o perigo, já era tarde, ela está enredada, e morrerá sufocada em poucos minutos.
Sistemas esvaziam o conceito de sacralidade. Em Sodoma e Gomorra os genros ridicularizam de Ló quando este falou que Deus iria destruir a cidade. A ideia secularizada não permite que as pessoas pensem que o sagrado interfira na história, que Deus possa agir no tempo. As filhas de Ló também não acreditaram. Elas foram tiradas à força. A mulher de Ló, submissa, também segue arrastada, mas seu coração não consegue romper com o luxo, comodidades e conforto que tinha na cidade, como uma mulher de posse. O sistema também enfraquece os valores no coração de Ló, e isto é perceptível quando ele se envolve sexualmente com suas filhas. O álcool pode quebrar as resistências morais de uma pessoa, mas não retira a consciência. A pessoa é responsabilizada pelos seus atos se os pratica sob o efeito do álcool.
Todos estes efeitos danosos do pecado atingem família, sociedade, igreja. A cosmovisão é afetada, novos comportamentos e atos são incorporados. É a força do sistema.
Por isto a Bíblia recomenda:
“Não ameis o mundo, se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele."
“Não vos conformeis com o mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente.” (Rm 12.1) Há um esquema, um molde, uma estrutura na forma de pensar que facilmente adotamos sem julgar, sem estabelecer juízo critico, incorporando-os ao nosso estilo de vida.
É preciso renovar a mente. Paulo afirma: “Se antes conhecemos a Cristo segundo a carne, já agora não o conhecemos deste modo.” (2 Co 5.16
A mente de Cristo precisa tomar a nossa mente. Não basta ser crente, é preciso pensar como Cristo.
2. Precisamos entender que a nova geração precisa de cuidados.
Irmãzinha sem seios... o que fazer? Nem chegou a puberdade.... antes do namoro, antes do casamento. que faremos a esta nossa irmã, no dia em que for pedida?
Precisamos cuidar das crianças quando ainda são muito tenras. A pressão social é cada vez mais precoce sobre as crianças e família. A estrutura de poder reforça esta pressão pelo sucesso, popularidade, aceitação social, e a dinâmica do capital se torna idolátrica nas nossas famílias que lidam com o dinheiro como um verdadeiro Deus, Mamom.
Precisamos de um diligente cuidado com a nova geração. Não podemos demorar, tem que ser feito com antecedência... atenção... é para agora. O que faremos com nossa irmãzinha que não tem seios?
Em Ex 8, o povo de Deus está saindo do Egito. Quando Moisés fala que teriam que prestar um culto a Deus, Faraó responde que os adultos poderiam ir, mas as crianças ficariam no Egito. (Ex 10.10-11) Entretanto Moisés afirma que deveriam ir pelo deserto, caminho de três dias (Ex 8.27). Tinham que sair para bem longe do Egito. Faraó propõe que as crianças fiquem (Ex 10.10,11) Moisés diz não. O diabo não se preocupa conosco, desde que deixemos nossos filhos no mundo, nas mãos de Faraó, assimilando a cultura do Egito.
Muitos pais estão cultuando, mas os filhos estão ficando para trás. Este é o tempo que temos para influenciar nossos filhos.
Com 14 anos o poder de influência da família é cada vez menor
Com 18 anos, pouca influência da família
O que fazer com meninas que ainda não tem seios?
O texto fala das duas possibilidades?
“Se ela for um muro, edificaremos sobre ele uma torre de prata; se for uma porta, cercá-la-emos com tábuas de cedro.” (Ct 8.9).
É necessário observar que as crianças possuem duas possibilidades: de serem muros ou de serem portas. Qual o significado de cada uma destas vertentes?
Qual é a ideia de muro?
Muro é ideia de resistência, e foi esta uma das declarações finais da Sulamita quando diz: “Eu sou um muro, sendo assim, fui tida por digna de confiança do meu amado.” (Ct 8.10). Dizer que é um muro, é um ponto de honra para esta mulher. Há muitas mulheres ouvindo cantadas e sendo assediadas, mas ao invés de dizerem não com veemência, agem com instabilidade e frouxidão. Mulheres precisam ser muro de resistência para sistemas e homens inescrupulosos, mas precisam também ter grande liberdade sexual para dizer ao seu amado:
“Levanta-te vento norte, e vem tudo vento sul, assopra no meu jardim,
Para que se derramem os seus aromas.
Ah! Venha o meu amado para o seu jardim e coma os seus frutos excelentes!”
Ct 4.16
Esta é uma linguagem de alguém que é aberta e celebra a sexualidade. Mas esta mulher é um muro, quando precisa ser. Quando o rei, a assedia e galanteia, tentando conquistá-la, ele diz:
“os teus beijos são como bom vinho...” (Ct 7.9
Qual a resposta que ela dá?
“Vinho que escoa suavemente para o meu amado.” (Ct 7.9)
O que ela diz ao rei é que seus beijos são bons, mas não para seu bico... seus lábios anseiam e se entregam para o amado.
Quando o rei se insinua para ela, ela diz:
“Tomara fosses como meu irmão...” (Ct 8.1)
“A sua mão esquerda estaria (condicional presente) debaixo da minha cabeça,
e a sua direita me abraçaria” (Ct 8.3)
Ela deixa claro ao rei que se o rei fosse seu amado, ele teria tudo dela, mas como ele é “apenas” o rei, ele jamais colocará sua mão esquerda debaixo de sua cabeça. Ela está descrevendo a posição sexual.
A Sulamita é aberta quando precisa ser,
Mas ela é um muro, também quando precisa ser...
Ela tem muito amor, e forte sensualidade, mas este amor é reservado, tem dono, ela guardou para o seu amor 7.13;8.10. O amor envolve todo o seu corpo, é algo apaixonado e lindo, mas é maravilhoso porque é reservado.
Então,
“Se esta criança for um muro, que lhe faremos?”
Os comentaristas acreditam que muro, é uma referência às meninas que são firmes nos seus valores, assumem posições sólidas quanto à sua fé e ética e tem claras convicções sobre valores e princípios. Quantos adolescentes na igreja são tão firmes no Evangelho? Que benção encontrar estes meninas assim, que são muros. Sobre estes, precisamos “edificar uma torre de prata.” Vamos colocar uma estrutura firme, tendo pratas como ornamentos, Muro aponta para firmeza de caráter que combina com Ct 8.10. Vamos adornar a geração que não se encurva diante da proposta de liberdade sexual e nem aceita as sugestões encantadoras e falsas de Satanás.
Joseph Benson ao comentar este texto pensa no papel do pai e da mãe, como trabalhadores acrescentando mais força e beleza, adornando...
E.W. Bullinger afirma que um muro impede todos os intrusos. Portanto, trata-se de uma fortaleza inexpugnável que não pode ser penetrada. Precisamos construir uma torre de prata neste muro, e decorá-lo ainda mais, adorná-lo.
Mas, e se ela for uma porta??? Cercá-la-emos com tábuas de cedro...
Aqui temos uma situação bem complexa e real. Uma realidade muito presente na vida de filhos de crentes, infelizmente. Michael Eaton afirma que se trata de alguém acessível a sedução e que necessita de fortes tábuas de cedro, pois precisa ser fortalecida. São pessoas que abrem as portas, tornam-se acessíveis ao mal e às influências que recebem . São influenciáveis e frágeis emocional e espiritualmente
Joseph Benson comenta: “E se ela for como uma porta – que é mais fraca que uma parede; se ela é fraca na fé, ainda assim nós não a rejeitaremos, mas iremos fortalecê-la e fortificá-la com tábuas de cedro.” Em outras palavras, cuidaremos dela, fortalecendo suas estruturas, prestando mais atenção, colocando mais tábuas como cerca. Ela precisa ser protegida das brechas que ela mesma abre.
E.W. Bullinger afirma que um muro impede todos os intrusos, mas uma porta é algo acessível a qualquer um.
O fundador do metodismo, John Wesley afirma:
“Se for um muro, construiremos sobre ela um palácio de prata, adicionaremos mais força e beleza, ampliaremos e adornaremos; e se ela é como uma porta, mais fraca que uma parede; fraca na fé, iremos fortalecer ou fortificá-la com tábuas de cedro, que não são apenas bonitas, mas também fortes e duráveis.”
Se a moça crescer virtuosa e inacessível à sedução, providenciaremos uma casa ilustre; mas se for o contrário, nós a cercaremos com tábuas de cedro, tomaremos precauções mais rigorosas para protegê-la da pressão e da sua instabilidade e pusilanimidade. Pode ser que sejam volúveis, influenciáveis... sugestionáveis... e se nossos filhos forem assim?
Certa vez conversava com um amigo meu, e vendo sua filha tomando rumos tão estranhos e decisões morais tão pecaminosas, eu comentei que o problema dela eram suas amizades, mas ele respondeu: “Não! O problema é que ela gosta de coisas erradas. Na verdade eu tenho pena das amigas delas.”
Este é um bom exemplo de filhos vulneráveis, que precisam ser protegidos. São volúveis e fracos de caráter, possuem uma propensão para o erro e para o pecado.
Certa mulher estava assustada com sua filha, que segundo ela, estava se envolvendo perigosamente com um primo que abusava dela. Ao aprofundarmos o assunto, descobri que sua filha era mais velha que o “suposto abusador”. Ela tinha 18 e ele 17 anos. Na verdade, ela estava “abusando” dele, ela era o problema. Ela o seduzia. Muitas vezes achamos que o problema são os outros, e nos esquecemos que nossos filhos, abrem brechas, caminhos de passagens, são portas, vulneráveis, volúveis, fracos de caráter. Se for porta, precisamos firmar mais, colocar mais proteção, atenção, cuidado.
Portas e muros apontam para dois caminhos: Moralidade firme ou fragilidade moral.
Precisamos de ações diferentes, para cada uma destas situações. Seja qual for a posição, a próxima geração precisa de cuidado: Precisam ser reforçados e quem coloca o reforço são os pais.
Não dá para transferir para quem é inexperiente a tarefa de se proteger. Precisamos proteger nossos filhos e netos. Deus nos deu a responsabilidade de orientar, de estabelecer os marcos, temos a responsabilidade de conduzir, guiar. Não transfira para os filhos as determinadas decisões que eles devem tomar, porque muitos ainda não estão preparados para as propostas que receberão ou não possuem estrutura de caráter. Muitas vezes as decisões devem passar pelo nosso crivo. A responsabilidade é nossa.
Em nossa cidade, são famosas as “festinhas de aniversários”, dos amigos da escola. Nossos filhos querem ir. Eles são adolescentes, e a festa começará as 23 hs. Como pais somos pressionados em tais situações, nossos filhos reagem violentamente ao não, afinal, “todo mundo vai!” Se você tem filhos adolescentes você sabe o que um eles são capazes de fazer quando os pais dizem Não! Sua casa vai virar um campo de batalha, um verdadeiro inferno de mau humor, hostilidade e raiva, mas a verdade é que não dá pra soltar uma filha de 16 anos numa boate, entregando-a a determinados ambientes nos quais ela não terá condições de se manter firme. O problema não é o que eles farão, mas o que faremos.
A ênfase do texto não está no que a futura geração é capaz de fazer, mas o que como pais faremos. "Não existem filhos problemas, existem pais problemas." Precisamos trazer a responsabilidade de proteção de nossos filhos para nós mesmos. Esta é uma tarefa pesada, mas não precisamos mendigar autoridade para isto. Deus já nos deu esta autoridade, apenas precisamos exercê-la. Ao fazer assim estamos protegendo, para que não sejam pegos nas armadilhas de seus próprios corações propensos ao pecado.
Não estamos falando de hiper proteção, nem de filhos mimados, que nunca sabem se defender. Precisamos ajudá-los nas decisões, levá-los à compreensão do que devem fazer. Hiper proteção gera filhos inseguros, tímidos, o que é negativo. Mas precisamos dar liberdade na medida em que eles souberem lidar com a liberdade que recebem.
Por que será que a palavra de Deus é tão enfática na obediência e honra que os filhos devem aos pais?
“Filhos, em tudo obedecei a vossos pais, pois fazê-lo é grato diante do Senhor.” (Cl 3.20).
Por que Deus ordena isto aos filhos? Por que eles devem obediência? A obediência irá protegê-los nas decisões que eles ainda não são capazes de tomar para si mesmos. Pais foram dados por Deus para dirigir, orientar, educar e guiar. É tarefa dos pais cumprir este papel, para que assim seus filhos sejam abençoados. Filhos obedientes glorificam a Deus e são abençoados: “fazê-lo é grato diante do Senhor.”
Considerações finais
Todas estas decisões morais são importantes, somos falhos e pecadores. Dizemos sim quando precisamos dizer não; e não quando deveríamos dizer sim.
Precisamos orientar, evitando a frouxidão moral quando os pais passam a ter medo da reação dos filhos e são controlados pelo seu mau humor e ira, e precisamos evitar a rigidez moral, do excesso de controle, que não deixa o filho crescer emocional, assumir seu papel de homem ou de mulher, se tornar pessoas responsáveis e capazes de tomar decisões por si só.
Precisamos de Jesus. Quem tem equilíbrio entre estas questões? A canção, “Deus Cuida de Mim”, do
Kleber Lucas diz:
Eu
preciso aprender um pouco aqui
Preciso aprender um pouco ali
Eu preciso aprender mais de Deus
Porque Ele é quem cuida de mim
Precisamos de Jesus para nos orientar, abrir as Escrituras, pedir sabedoria.
Que Jesus nos abençoe.
Este texto nos ensina que:
1. Os problemas de uma geração para a outra só mudam a forma e o local.
a. O problema básico da humanidade é o coração pervertido. Uma vez perguntaram ao grande teólogo católico, Chesterton, qual era o grande problema da humanidade, e ele respondeu prontamente: EU!
b. Paulo fala de uma geração corrompida e corrupta: “Fazei todas as coisas sem murmurações nem contendas; para que sejais irrepreensíveis e sinceros, filhos de Deus inculpáveis, no meio de uma geração corrompida e perversa, entre a qual resplandeceis como astros no mundo.” Fp 2.14-15)
c. Pedro fala de uma geração tão moralmente caída que estranhava que a igreja não concorresse ao mesmo excesso de devassidão. (1 Pe 4.4)
d. Schaeffer: “A nova moralidade nada mais é que a antiga imoralidade.”
2. Sistemas interagem com brutalidade usando as estruturas de poder.
a. Salomão e seu poder, sua glória, sua fama, sua posição.
b. Os elementos presentes neste texto são os mesmos que atualmente são utilizados.
i. Dinheiro - Estrutura Econômica: Que acredita que pode comprar tudo, que pode conseguir o que se deseja, apenas pagando. Por isto este texto é tão enfático, em desprezar o dinheiro. "As muitas águas nao poderiam apagar o amor, nem os rios afogá-lo. Ainda que alguém desse todo dinheiro pelo amor, seria de todo desprezado." (Ct 8.7)
A sulamita zomba do dinheiro. "Tu Salomão, terás os mil siclos, e os que guardam o fruto dela, duzentos." (Ct 8.12) É preciso menosprezar o poder do dinheiro, ídolo central na estrutura de poder. A sulamita se sente vitoriosa: " A vinha que me pertence, está a meu dispor; tu, ó Salomão, terás os mil siclos, e os que guardam, duzentos."
ii. Guardas: Estrutura de força - Os guardas se encaixam neste sistema. Eles também tem lucros. Eles receberam dinheiro. Um siclo é uma unidade financeira, salário de um dia de um trabalhador, que dava para sustentar uma família. Não era pouco dinheiro. São cerca de 8 meses de trabalho, se considerarmos os dias de sábado e festividades.
iii. Filhas de Jerusalém: Peer-pressure. São as pessoas que andam ao nosso redor. Nos ouvem, dialogam conosco. como temos uma cosmovisão pecaminosa, e uma cultura afetada profundamente pela queda, é natural que esta se constitui uma força tão violenta. Os Guiness fala da cultura como uma jibóia, que hipnotiza sua presa, a envolve e a estrangula. Quando a presa se dá conta, já não é capaz de fazer mais nada.
c. A família impotente
i. Sulamita: Juventude roubada. Esta jovem menina, de zona rural, é profundamente atingida pela cultura. Ela tinha o que a sociedade quer: um rosto bem formatado e um corpo bonito. Sua expressão de impotência se reflete logo no início: "A vinha que me pertence, esta eu não guardei." (Ct 1.6). Sua juventude foi sequestrada, seus projetos e desejos, seu sonho e seu amor não importa diante de uma sociedade massificada, voltada para o lucro e que menospreza o amor e os valores.
ii. Somos desafiados a olhar com cuidado a próxima geração – (Ct 8.8-9). O tratamento deve ser meticuloso e detalhado. “Se ela for um muro, edificaremos sobre ele uma torre de prata; se for uma porta, cercá-la-emos com tábuas de cedro.” (Ct 8.9). Nada pior que dar tratamento igual a pessoas diferentes: Esaú, Jacó
Como romper as estruturas de poder?
1. Denúncia divina. Cantares é uma denúncia. O Evangelho é uma denúncia. Ct 8.6 - Selo era um anel, que representava a pessoa (Gn 38.1-30), especialmente 25-26.
Anel implica em voto e confiança. O amor é forte, "mais que a morte”, mas não pode ser comprado, é voluntário. O despertamento do amor deve existir quando puder, nada de forçar a barra. Mulher não é prostituta. Cântico é importantíssimo para a vida do povo de Deus, precisamos aprender a cantar. Despertar o amor no tempo certo, da forma certa, carregado de lealdade, sensualidade, fidelidade. E resgatarmos o conceito bíblico que diz:
"O amor é forte como a morte." (Ct 8.6)
Por isso,
"As muitas águas não poderiam apagar o amor, nem os rios afogá-lo, ainda que alguém desse
todos os bens de sua casa pelo amor, seria de todo desprezado". (Ct 8.7)
O amor verdadeiro zomba de toda tentativa de dominação e exploração, do forte contra o fraco,
do dominador contra o dominado. Do poderoso contra o que não tem poder.
Somente o amor pode zombar daqueles que julgam poder comprar tudo, mas não conseguem comprar o que só surge espontaneamente: Quando ele desperta, é forte como a morte. Mas não dá para comprá-lo, nem despertá-lo, até que este o queira.
2. A importância de entender a força do sistema e estarmos atentos. Questão de foco, atenção. “Temos uma irmãzinha.” Ela precisa ser observada, cuidada. Esa irmã já está entre nós.
4. A importância de estratégias de ação. O que faremos?
a. Precisamos criar defesas. Não hiper proteção.
b. Precisamos ajudar de forma particular e individual, considerando as peculiaridades. Uma é porta, outra é muro. Ambas precisam de cuidado, mas diferentes. Nada pior que tratar pessoas diferentes de forma igual.
5. É necessário dar valor àquilo que tem valor
a. Não menospreze o afeto, nem o diminua!
i. Sulamita é apenas uma menina impotente e pobre colocada a serviço de um monarca vaidoso e arrogante.
ii. Dinheiro não compra tudo: “Ainda que alguém desse tudo pelo amor, seria de todo desprezado.”
iii. Amor não pode ser sufocado. “As muitas águas não poderiam apagar” (Ct 8.12)
6. É preciso coragem ara enfrentar os sistemas e não ceder às pressões – Lute contra o sistema
a. Rm 12.1,2 – Lutamos com uma ordem mundial oposta ao reino de Deus. Sempre foi e sempre será assim.
b. Cuidado com a cultura.
c. Satanás quer nossos filhos – Quando Moisés foi comunicar a Faraó que o povo de Israel iria para o deserto para celebrar uma festa ao Senhor, ele indagou: "quais saão os que hão de ir? Moisés disse: "Havemos de ir com nossos jovens, e com os nossos velhos, e com os filhos, e com as filhas, e com os nossos rebanhos, e com os nossos gados; havemos de ir, porque temos que celebrar uma festa ao Senhor." (Ex 10.9). Faraó então retrucou: As crianças não irão: "Ide somente vós, os homens, e servi ao Senhor..” (Ex 10.11)
Saia do Egito, mas deixem os seus filhos – (Ex 10.8-11). É este o plano de Satanás. Não levem seus filhos. Vão adorar, mas deixem as crianças e os jovens no Egito. Esse é um laço mortal para a família. O diabo até admite que a gente vá, mas sem os filhos. O que o diabo quer é arrebentar com a família. Ele é ladrão. Quer gerar divisão, contenda, o conflito espiritual. Ele não gosta de ver lares no altar do Senhor, ele emprega todos os meios para atacar a unidade da família. O diabo abre mão dos maduros e idosos, desde que possa atacar a juventude e as crianças. Não é sem razão que temos visto cada vez mais jovens viciados, crianças deprimidas, gente sem sonhos, corações vazios. Veja o alto grau de investimento da mídia para alcançar as crianças. Há um esforço concentrado do diabo para banir da mente da criança a idéia de um Deus pessoal. As crianças hoje recebem uma carga muito alta de imagens e sons, com excesso de violência e apelo sexual. E o que dizer dos jovens, com as músicas falando de ocultismo, sensualidade barata e satanismo, minando os alicerces espirituais. Muitos jovens que outrora andavam com Deus, estão agora sucateados pelo pecado, esmagados pelo sentimento de culpa. Muitos jovens dizendo que o Egito é o lugar deles mesmos, que desejam o Egito e permanecem no Egito. O diabo é estelionatário, oferece prazer e dá desgosto, promete diversão e dá frustração, promete vida e dá morte. O prazer que o mundo oferece produz dor.
Moisés responde: Nossos filhos precisam ir. "Havemos de ir, porque temos que celebrar uma festa ao Senhor."
Quando não trazemos nossos filhos à presença Deus, deixando de ensinar-lhes a palavra, de inspirar-lhes temor, nós os perdemos. Eles ficam no Egito. Não deixem seus filhos no Egito!
Veja quantas vezes a Bíblia, apenas no livro de Isaias, faz inclusão de nossos filhos no pacto, na aliança do povo de Deus: Is 44.3;54.13;59.21;61.9;58.12; 65.23.
Certa mãe cristã, me disse que iria tirar seu filho de uma escola cristã, e o colocaria em outra escola porque seu nível acadêmico é melhor. Eu respondi: “Não acho que este seja o grande problema da vida de nossos filhos. por causa do ambiente em que convivem, e pela carga e conteúdo de ensino que eles receberem, eles serão bem-sucedidos.” O que pode destruir nossos filhos não é uma questão acadêmica, mas o pecado (jovens sucateados), um namoro fora dos padrões de Deus, envolvimento com meninas que não amam a Deus, envolvimento com drogas ou um casamento mau feito. Nosso grande desafio não é acadêmico, mas espiritual.
7. É preciso cuidar preventivamente.
i. “Ainda não tem seios.” Não podemos demorar. A educação tem que começar cedo.
ii. Jó investia espiritualmente: Tempo, dinheiro, e fazia isto rotineira e individualmente. (Jó 1.1-4)
iii. Existe uma janela de idade nos nossos filhos que precisam de atencao redobrada. É a janela 4/14. Crianças desta idade são mais propensas a tmarem posições por Cristo e recebem ainda mais influencia de casa. Depois dos 14 anos a familia vai perdendo cada vez mais seu poder de influência sobre eles. Precisamos orar, vigiar, cuidar “Para que nenhum deles se perca.”
7. Mantenha a esperança: Viva sempre na perspectiva pactual. (pacto geracional (Susan Hunt) ou federativo. Você é aliancista? Crê na perspectiva do pacto para sua família e geração?
a. Van Groniken- A família do pacto
b. Susan Hunt: A graça que vem do lar
c. Gn 17.7: Pacto, com rito. Circuncisão. Órgão reprodutor masculino
d. Is 65.23: Não terão filhos para calamidade
e. At 16.31: Será salvo, tu e tua casa
8. Não negocie os termos com Faraó
Não adoraremos o Senhor no Egito – Ex 8.25
b. Não ficaremos perto do Egito para adorar o Senhor – Ex 8.28
c. Nossos filhos irão – 10.9
d. Nossos bens irão – 10.24
e. Nada ficará no Egito 10.26
f. No Egito, nem morto – Gn 50.26; Ex 13.19
9. Entenda a dimensão da obra sacrificial de Cristo e seus impactos em nossa cultura familiar e viva debaixo desta benção.
a.