No
livro O Totem da Paz, (Don Richardson, Ed Betânia, Venda Nova, 1974,
pg 208-218), há um relato intrigante presenciado pelo autor de uma cerimonia de
paz entre o povo sawi e kamur, na antiga área holandesa da Nova
Guiné.
Durante
alguns anos o missionário tentava manter a paz entre os dois povos, em vão. Os
conflitos tribais faziam parte dos rituais e lutas entre as diferentes etnias e
tais brigas eram históricas. Cansado de presenciar tantas brigas e mortes,
Richardson ameaçou sair da região caso eles não vivessem em paz. Para aquelas
tribos isto seria um desastre, porque além da saúde e cuidados, ele trazia
ferramentas como machados, facas, facões, enxadas, que eram muito úteis para pessoas
que tinham que lidar com a floresta.
Então, um fato inesperado aconteceu.
Um
dia, ele ouve um estranho barulho entre estes dois povos, e saiu assustado
pensando se tratar de mais uma briga. Foi quando ele viu nos braços de Mahaem,
líder dos Sawis, com seu pequeno filho de seis meses, e atrás dele sua esposa Syado
soluçando compulsivamente. O povo kamur, em massa, também descia de suas casas.
A criancinha agarrada ao pescoço do pai, parecia passiva e inconsciente de que
algo incomum pudesse acontecer.
Syado
desesperada tentava retirar a criança das mãos do pai, mas em vão. A aldeia
entra em convulsão e murmúrio, gritos de mulheres apreensivas, e o missionário
ouvia o pai gritando palavras incompreensíveis e toda aldeia em grande tumulto.
A
seguir, o pai entrega seu filho ao seu irmão dizendo que não tinha coragem de
fazer o que precisava. O missionário não sabia o que aquilo significava e ficou
apreensivo pensando tratar-se de algum sacrifício de criança. A certa altura,
um homem da outra aldeia destacou-se do grupo e correu em direção a seu filho Biakadon,
seu único filho que estava deitado na esteira. Só então sua esposa Wumi
percebeu o que ia acontecer e saiu correndo atrás do marido, suplicando-o com
toda força que não fizesse aquilo.
Fracassada
do seu intento, ela deixou-se cair numa poça de lama e numa angústia profunda
de alma, impotente, começou a gritar: “Biakadon, Biakadon, meu filho!”
Quando
os dois homens se aproximaram, e disseram um ao outro: “Você quer defender os
interesses do seu povo perante o meu povo?” e mediante resposta positiva,
trocaram seus filhos, e as duas aldeias ergueram-se com gritos de kahap kaman, que fazia a terra
estremecer.
Logo
que uma das tribos se distanciou, o homem gritou: “Aqueles que aceitam esta
criança como oferenda de paz, venham aqui e imponham as mãos sobre ela” e foi
então que todos, puseram-se em fila e foram colocando a mão sobre a criança,
demonstrando sua aceitação pelo tratado de paz.
Sem
entender o ritual, o missionário apressou-se a indagar o que aconteceria com as
crianças que agora foram trocadas de tribo. Seriam elas sacrificadas? Que tipo
de sacrifício seria este? Algumas
parentes da mulher orfanada de seu filho se acercaram dela e começaram a chorar
juntas, enquanto o novo membro de tribo era levado para a “casa dos homens”.
O
que aconteceria a estas crianças?
Um
dos homens mais próximos lhe explicou: “Elas não sofrerão dano algum, pelo
contrário, as duas aldeias vão proteger a vida desses filhos da paz com mais
cuidado do que protegem seus próprios filhos. Porque se eles morrerem, a tribo
não mais estará obrigada ao acordo de paz.”
A
paz fora comprada por um alto preço.
As
crianças ganharam diferentes nomes e nova família, não era mais um estranho,
mas fora acolhido como um homem daquela tribo. Depois deste evento, as tribos
novamente se encontraram, agora como um único povo para dançar, formando
círculos que simbolizavam um abraço maior, e carregando seus penhores de paz,
vivos e alegres. A inimizade e a desconfiança agora desapareceram. Se um homem
dava seu filho para seus inimigos, então ele poderia merecer a confiança. Esta
prova de sinceridade eliminava qualquer sombra de dúvidas.
Ao
ler este relato, pude imaginar o que Deus conosco:
Ele
deu seu único Filho. A diferença é que nada demos em troca.
Ele
deu seu único Filho. Mas ele não foi poupado, mas de fato morreu.
Ele
deu seu único Filho para reconciliar seus inimigos, trazendo a paz. O ofendido
faz uma oferta de paz aos ofensores.
Sua
iniciativa foi unilateral.
Ele
sofreu toda a dor de ver seu Filho humilhado, para nos resgatar dos nossos pecados.
Mas a
paz foi feita, mediante seu sangue.
A parede da separação agora foi destruída.
Justificados diante de Deus, agora temos paz por meio do sangue de seu Filho.