domingo, 4 de novembro de 2012

O Mundo espiritual


 

Um dos meus 9 tios do lado materno (do lado paterno eram 10) era, de longe, o predileto de minha mãe. Com razão, já que o mesmo sempre a visitava e era o único que morava na mesma cidade. Gostava de almoçar e tomar café em nossa casa, era companheiro de meus pais em dias difíceis, embora discordassem profundamente nas coisas espirituais. Por diversas vezes meus pais tentavam comunicar o evangelho e falar do plano da salvação em Cristo, mas sua resposta era sempre um incomodo silencio.

Quando resolvia falar, era sempre para contraditar, gerar questões, não de forma declarada, mas dialética: “Eu não sei se Deus existe com tanto sofrimento...“. Ou, “Eu não sei se existe esta coisa de céu e inferno“ ou ainda “Por que existem tantas religiões se Deus é um sõ?“. Quem lida com comunicação das verdades da Bíblia sabe que estes argumentos revelam o fato de que coisas espirituais realmente não são tão importantes para tais pessoas.

Ele era boêmio por natureza. Gastava suas noites bebendo, fumando e jogando. Às vezes perdia, noutras ganhava, e muitas vezes passava não apenas horas, mas dias e noites inteiras, ao redor de uma mesa de jogo. Tinha um temperamento forte e não era de levar desaforos para casa, algumas vezes chegou a empunhar armas para inibir seus desafetos. Gostava de dirigir em alta velocidade e detestava toda limitação física. Parecia ser dominado pelo pensamento mágico de que a enfermidade não o dominaria. Por isto não se entregava, nem se rendia.

Herdou de sua mãe uma propensão à pressão e colesterol altos, coisas estas que, infelizmente, também herdei, mas ele rejeitava se submeter aos tratamentos médicos, tomar remédios, e muito menos fazer qualquer dieta. Com o tempo, tornava-se claro que ele gostava mesmo de ser contraventor. Se lhe era dito para não comer comidas gordurosas, torresmos e frituras, era exatamente isto que ele queria nas refeições.

Com pouco mais de 60 anos, seu corpo sucumbiu e ele teve seu primeiro AVC., e daí para a frente seu quadro de saúde foi se complicando. Isto não o intimidou, pois ele parecia realmente acreditar que nada deveria limitá-lo. Veio assim o 2º AVC, que definitivamente o fragilizou, tendo de ser deslocado para Belo Horizonte, em busca de melhores tratamentos, num pequeno monomotor com UTI móvel para a capital mineira.

Ali, pela primeira vez, começou a admitir a possibilidade de buscar a Deus. Se por oportunismo ou necessidade, nunca o saberemos, mas quando a saúde permitia, ia atrás de igrejas pentecostais que anunciavam curas físicas, mas seu quadro se complicava cada vez mais. Os excessos de jogatina, bebida e especialmente do cigarro parecia ter deixado danos permanentes e irreversíveis.

Por alguns meses esteve internado em Belo Horizonte, e algumas pessoas, entre elas minha mãe e eu, orávamos, não apenas pela sua saúde, mas pela sua vida espiritual tão relapsa e distanciada de Deus. Neste tempo eu estava morando fora do Brasil e muitas vezes orei por ele. Numa noite, ele teve uma visão, alucinação ou sonho. Via-me acompanhado de uma pessoa vestida de branco, cujo rosto ele não conseguia distinguir, se aproximando do seu leito de hospital e orando por ele. No dia seguinte, queria me ver e perguntou para a acompanhante onde eu estava com aquele homem, porque a nossa presença tinha trazido muita paz ao seu coração, quando as pessoas disseram que eu não estivera ali, ele foi veemente em afirmar que sim.

Infelizmente ele não resistiu a enfermidade, vindo a falecer algum tempo depois. Desde que este episódio me foi narrado, tenho tentado entender seu significado. Será possível que a intercessão se torne assim tão concreta que se materialize a favor de outras pessoas? Que significado este episódio teve para sua vida?. Em Atos 12 lemos que, enquanto a igreja orava a favor de Pedro, um anjo abriu as portas da prisão por onde ele pode sair. Teríamos vivido alguma coisa semelhante aos dias primitivos com este evento? Teria Deus enviado um anjo para consolar meu tio, por causa da oração que fazíamos a seu favor?

Nunca teremos respostas conclusivas a estas perguntas, mas para meu tio, naquela cama de hospital, aquela experiência fora profundamente real.

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